"Há um tempo para a mágoa e um tempo para ir além da dor, como diria Pessoa, além da dor, o componente fundamental da mágoa é a sua permanência. uma incapacidade de parar de sofrer, mesmo com o passar do tempo". Para quem espera o perdão, o tempo é o maior inimigo, por isso é necessário praticar a paciência. A paciência serve de proteção contra injustiças como as roupas contra o frio. Se você veste mais roupas com o aumento do frio, este não terá nenhum poder para feri-lo. De forma idêntica você deve crescer em paciência quando se encontra em grandes dificuldades e elas serão impotentes para atormentar a sua mente. (Leonardo da Vinci).
Em
todos os caminhos de crescimento humano, tanto psicológico quanto espiritual, uma
ênfase especial é dada à questão da mágoa. Não só pelo sofrimento que ela
produz, mas também pelo transtorno que ela provoca nos relacionamentos. Qualquer
que seja o nome que damos a esse sentimento, seja mágoa, rancor, ressentimento
ou vingança, ele se caracteriza por uma amargura na alma, uma sensação de
injustiça, a partir do mal que alguém nos fez.
Além
da dor, o componente fundamental da mágoa é a sua permanência. É uma
incapacidade de parar de sofrer, mesmo com o passar do tempo. E como é
impossível levarmos nossas vidas sem sermos machucados, de vez em quando pelas
outras pessoas, sendo em vista a imperfeição da natureza humana, corremos o
risco de acumularmos ferimentos e nos tornarmos pessoas amargas, desiludidas e
sofredoras.
A
mágoa é uma forma de guardarmos para depois coisas que não resolvemos na hora. Uma
das características da vida é que ela só pode ser vivida no presente. O passado
e o futuro, apesar de existirem na nossa cabeça, não têm existência real. Seria
uma grande tolice imaginarmos que podemos respirar para amanhã, que podemos
viver o ontem. O natural é que as coisas sejam vividas, mesmo as ruins, no
momento em que elas acontecem.
O
sentimento da raiva, que é natural tem por objetivo, nos ajudar a resolver nossos problemas, incluindo
as ofensas, traições ou quaisquer outros atos que as pessoas nos produzem. Quando
somos inibidos na nossa raiva, quando temos medo de expressá-la, ela esfria
dentro de cada um de nós e se transforma em mágoa. Mágoa
é toda raiva que ficou para depois. É a raiva dentro da geladeira. É o medo de
resolver nossos conflitos com outras pessoas, no momento em que aparecem. Guimarães
Rosa define magistralmente, a mágoa no seu livro, Grande Sertão Veredas: "Mágoa
é lamber frio o que o outro cozinhou quente demais para nós”.
A
pessoa rancorosa apresenta pelo exposto até aqui, as seguintes dificuldades:
1- Em aceitar a imperfeição
humana, idealizando uma realidade onde as pessoas nunca falhem com ela.
2- Na expressão da raiva, na
colocação clara do seu desagrado diante do outro.
3- Em viver o momento
presente, sendo extremamente apegada ao passado.
Por isso,
a pessoa que guarda mágoa, em geral é também saudosista e culposa,
características de quem vive no passado. Uma vez, porém instalada a mágoa, só
nos resta uma saída: o perdão. Se a mágoa nos envenena e machuca, o perdão nos
alivia e cura. Pode-se
medir a sanidade psicológica de alguém pela sua capacidade de perdoar. O perdão
é a ponte que nos faz sair da depressão para a alegria. "Perdoai as nossas
ofensas, assim como nós perdoamos aqueles que nos ofenderam." Por que
tanta dificuldade em perdoar? — Porque há equívocos em torno do perdão
que nos dificultam o exercício dele.
Primeiramente,
há uma crença falsa de que o beneficiário do perdão é a pessoa que nos ofendeu.
O perdão é algo bom para quem perdoa. Perdoar é ficar livre da dor provocada
pelo outro. É ficar livre daqueles que nos magoaram. É um presente dado a mim
mesmo. Perdoar não é esquecer. É apenas parar de sofrer. Não nos incomodarmos
mais com o que aconteceu no passado. Devemos, porém aprender com a experiência
acontecida. Temos
de tomar posição diante do que aconteceu, revendo a relação, e por isso mesmo, nos
livrando do sofrimento. A mágoa deteriora os relacionamentos porque ao invés de
resolvermos os problemas, ainda que com uma briga, guardamos a raiva no coração
e ela se transforma em hostilidade, frieza e desprezo na relação, distanciamento
sexual, traição e outras formas de vingança. "Que o sol não se ponha sobre
nossas iras”. A ira santa é aquela do momento presente, como a experimentada
pelas crianças. A ira guardada para amanhã vira mágoa e fecha nossos corações
para o amor. Perdoar os outros é o presente que podemos oferecer a nós mesmos. Chega
de carregar na alma as ofensas e os que nos ofenderam.
Por Antônio
Roberto Soares.
"Tenho
paciência e penso: Todo o mal traz consigo algum bem”. –Beethoven.