sexta-feira, janeiro 22, 2021

Mundo dos Possíveis

Querer não é poder! 

De anos para cá, me tornei uma pessoa dada ao ceticismo, não pessimista, porém, mais realista e menos otimista.

Imagem de kinkate por Pixabay 


Até pela mudança brusca de comportamento social, pois,  “são tempos difíceis para os sonhadores” (Amélie Poulain). Vejo muitos dizeres por aí e mensagens que recebo: “Pense e receba”, “Querer é poder”, “Deseje e será seu”, “Durma e sonhe com seu objetivo, ele virá”, eu até trollei uma amiga e enviei de volta; ok, “Desejo casar-me com Roger Waters”, risos!

Já que basta pensar, dormir e desejar! Como pó de pirlimpimpim que num passe de mágica, o desejo se materializará. ¯\_(ツ)_/¯

 
 Imagem de GraphicMama-team por Pixabay

A partir de certas crenças de otimismo exagerado ou simplismo, a falsa ilusão de que se  "você não se deu bem, porque não desejou, não mereceu ou não se esforçou o suficiente". 

E para aqueles que alcançaram suas "dádivas" ou estão confortáveis em seus lares, relacionamentos e estabilidade financeira é mais fácil crer nessa  surrealidade, porque eles creem que são os "privilegiados" divinos como prega o calvinismo, por exemplo.

Mas experimente dizer isso para quem está com a vida de cabeça para baixo, revirada do avesso, vulnerável. Não quero dizer que não se deve ser otimista, sonhar alto, etc. e tal, como aquariana, elemento ar, vivo com a mente aqui e acolá, cheia de ideias e sonhos, mas sem apegos e pés no chão, o que vier é lucro, porém, passar a ideia aos que estão em dificuldades extremas, insegurança alimentar, rompimento de relações, desemprego, luto, pressões familiares, doenças ou contaminado pela Covid-19 lutando com a vida é inimaginável. De um egoísmo sem fim, desrespeitoso e falta de empatia. Em "Cândido",  uma das obras mais conhecidas do filósofo Voltaire, da qual li faz tempo lembra essa ambiguidade.




 De acordo com apresentação de  Nélson Jahr Garcia no prefácio do livro:
"Cândido" é uma das obras mais conhecidas de Voltaire. O texto contrapõe ingenuidade e esperteza, desprendimento e ganância, caridade e egoísmo, delicadeza e violência, amor e ódio. Tudo isso mesclado com discussões filosóficas sobre causas e efeitos, razão suficiente, ética. Como sempre Voltaire expõe suas concepções com fina ironia, sem abandonar o sarcasmo de quando em vez. O romance, em todos e cada um dos seus parágrafos, caracteriza-se como uma sátira às ideias de Leibniz.

 Leibniz afirmara, pelo menos assim entendeu Voltaire, 
que o mundo é o melhor possível, que Deus não poderia ter construído outro e que tudo corria às mil maravilhas. 
Voltaire não podia partilhar dessa mesma visão otimista, suas ideias tinham resultado em prisões e perseguições a tal ponto que, por volta de 1753, já não podia fixar-se, sem risco, em lugar algum da Europa.

Cândido foi expulso de onde morava, foi preso e torturado, 
perdeu sua amada, seus melhores amigos; em todos os casos com requintes de crueldade. Mas a cada um desses fatos, meditava sobre como explicar o melhor dos mundos possíveissempre com deboche mais ou menos sutil.

Ao contrário do otimismo de Leibniz  e sua bolha, Voltaire, via seu mundo desmoronar e de pernas para o ar, suas ideias, contrapontos e questionamentos o levaram à prisão e uma vida quase 
toda no exílio, na Inglaterra e depois na Suíça, destituído dos seus bens, mas mesmo assim [ele não parou de escrever, com seu ironia e deboches afiados, no fim se renderam à sua genialidade, por sua resistência e persistência.  Celine Dion trouxe a resposta em 2016 quando declarou:


“Eu não posso simplesmente viver pensando
'perdi meu marido, meus filhos não têm pai'.
Eu tenho que permanecer de cabeça erguida e
forte porque esta é a minha maneira de viver:
Fique de pé, seja positivo, escolha suas batalhas,
faça o melhor que puder e viva para hoje,
não para amanhã, e saiba que nada é perfeito,
nem tudo o que você quer, vai acontecer”.


Portanto, concluo que "querer não é poder", depende do ambiente externo, pessoas, fatos, oportunidades entre outros fatores. Assim como há coisas que não foram feitas para nós por mais que a desejamos ("Nem todos os caminhos são para todos os caminhantes", Johann Goethe, tem razão), como também há pessoas que vivem momentos delicados, passam por dores e privações inomináveis, minimizar seus sentimentos, ao criar falsas expectativas, talvez não seja o melhor caminho, mesmo que carregado de boas intenções, às vezes.

"Tudo isso está muito bem dito", respondeu Cândido, mas "devemos cultivar nosso jardim". Embora não seja o "melhor dos mundos possíveis", divididos entre o otimismo e o pessimismo, mas é o único mundo possível de se viver, então, vamos seguir em frente, mas sem deixar de olhar para os lados e para trás! Sempre aparando arestas, burlando o tempo, construindo pontes e derrubando muros, se equilibrando aqui e acolá!

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