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| Imagem de Sasin Tipchai por Pixabay | 
No Grande Sertão: Veredas, Rosa nos apresenta também o seu conhecimento sobre a vida e a 
dificuldade de viver e conviver. Em várias páginas desta obra, a vida 
marca as pessoas e esta marca oferece a oportunidade para a reflexão 
sobre si e sobre os outros.  Ele diz: “o senhor sabe: o perigo que é viver…”; “Viver é um descuido prosseguido”
Viver é perigoso 
porque a vida é única, pessoal, intransferível. Isto amedronta. É 
formidável. Quando se passam a outra pessoa as rédeas da própria vida, a
 pessoa se perde, se despersonaliza. Hoje, muitas pessoas se sentem 
incapazes de decidirem os rumos da sua vida. Dependem sempre de 
conselhos e de opinião de outras pessoas sobre si mesmas ou de leitura 
de livros de autoajuda.
Rosa escreveu que “cedo aprendi a viver sozinho”,
 isto é, aprendeu a decidir os rumos de sua vida desde pequenino. E, 
mais tarde, ele, feliz com a própria decisão, nos revela que “viver é 
muito perigoso, mesmo”.
A vida é perigosa, mas é necessário o amor para viver perto da outra pessoa, sem o perigo de ódio. “Só
 se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de 
ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um 
descanso na loucura. Deus é que me sabe”.
Viver com a outra pessoa exige proximidade, olho no olho. Confidencialidade. “Viver perto das pessoas é sempre dificultoso, na face dos olhos”. O
 dia a dia leva muitas pessoas a não verem a outra pessoa. Tudo parece 
banalizado, sem sabor, sem sentimentos, sem paixão. O marido não percebe
 a esposa e os seus sentimentos, a esposa não sente a atenção do marido,
 pais e mães não conhecem os filhos, não conversam com eles. As relações
 são frias e interesseiras.
Esta experiência, às vezes, traz desconsolos e esperanças: “o
 senhor entende, o que conto assim é resumo; pois, no estado do viver, 
as coisas vão enqueridas com muita astúcia: um dia é todo para a 
esperança, o seguinte para a desconsolação”.
Ao mesmo tempo, pouco a pouco, há a alegria pessoal com a vida. Esta alegria supera a tristeza. É uma aprendizagem diária: “e
 fui vendo que aos poucos eu entrava numa alegria estrita, contente com o
 viver, mas apressadamente. A dizer, eu não me afoitei logo de crer 
nessa alegria direito, como que o trivial da tristeza pudesse retornar. 
Ah, voltou não; por oras, não voltava”.
Rosa nos mostra que 
ninguém nasce para permanecer perdido na vida. Cada pessoa tem a sua 
vida e pode descobrir a sua maneira única de viver consigo e com os 
outros. Sempre há caminhos, cada um tem o seu e sabe que tem. Ele mesmo 
quem diz:
“Sempre sei, realmente. Só o que eu quis, todo o tempo, o que eu pelejei para achar, era uma  só
 coisa – a inteira – cujo significado e vislumbrado dela eu vejo que 
sempre tive. A que era: que existe uma receita, a norma dum caminho 
certo, estreito, de cada uma pessoa viver –  e essa pauta 
cada um tem – mas a gente mesmo, no comum, não sabe encontrar; como é 
que, sozinho, por si, alguém ia poder encontrar e saber? Mas, esse 
norteado, tem. Tem que ter. Se  não, a vida de todos ficava sendo sempre o confuso dessa doideira que é. E que: para cada  dia, e cada hora, só uma ação possível da gente é que consegue ser a certa”.
Na maturidade, (como é importante escutar os idosos, aprender com eles), Rosa nos diz que viver é aprender a viver: “O
 senhor escute meu coração, pegue no meu pulso. O senhor avista meus 
cabelos brancos… Viver – não é? – é muito perigoso. Porque ainda não se 
sabe. Porque aprender-a-viver é que é o viver, mesmo”.
Autoria by José Ildon Gonçalves da Cruz - Publicado em 9 agosto, 2008.
Fonte: http://joseildon.wordpress.com/2008/08/09/guimaraes-rosa-na-abc-viver-e-muito-perigoso-mesmo-5/  
