"A miséria das
classes baixas é sempre maior que o espírito de fraternidade das classes
altas." Victor Hugo.
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Reprodução Internet - Filme. |
Os Miseráveis é uma obra-prima de Victor
Hugo das mais instigantes e envolventes.
Faz alguns anos que assisti ao filme e Liam Neeson era o protagonista.
A trama aborda as questões políticas e sociais, a ética cristã acima da
moral, sociedade indiferente. Um livro grandioso, intenso que mexe com as
emoções e juízo de valor, onde personagens sedentos por justiça e oportunidades
se enfrentam com os frios e obstinados, numa cruzada entre valores morais, éticos, hipocrisia social, a dura e cruel realidade social e seus desiguais. Para entender o enredo um breve resumo sobre os personagens
centrais:
Jean Valjean - preso e condenado pelo roubo de um pão.
Personagem principal em que gira a trama, condenado
por roubar um pão,
para alimentar sua irmã. Posto em liberdade após dezenove anos de prisão.
Rejeitado pela sociedade por ser um ex-presidiário, ao conhecer o Bispo Myriel
muda sua vida por completo, pois, ele lhe dá oportunidade de uma construir uma
nova história. E então, assume uma nova identidade para seguir uma vida honesta, tornando-se proprietário de uma fábrica e prefeito.
Bienvenu, Bispo de Digne (Charles François Bienvenu Myriel)
Um sacerdote idoso e gentil, promovido a bispo por um encontro casual com Napoleão. Ele salva Valjean de ser preso após roubar sua prata e o convence a mudar de comportamento.
Fantine
A costureirinha parisiense abandonada com uma filha pequena pelo seu amante Félix Tholomyès. Fantine deixa sua filha Cosette aos cuidados dos Thénardiers, estalajadeiros em uma aldeia chamada Montfermeil. Infelizmente, Sra. Thénardier mima suas próprias filhas e abusa de Cosette.
Fantine encontra trabalho na fábrica de Madeleine, mas a supervisora descobre que ela é uma mãe solteira e a demite.Para atender às exigências de dinheiro dos Thénardiers, ela vende o seu cabelo, e depois os seus dois dentes da frente e, finalmente, acaba na prostituição. Valjean toma conhecimento de sua situação quando Javert ia prendê-la por atacar um homem que, a insultou e atirou neve em suas costas.
Cosette - filha de Fantine.
(Euphrasie, Cotovia, Ursule, Senhora Pontmercy)
A filha ilegítima de Fantine e Tholomyès. Entre a idade de três a oito anos, ela é espancada e obrigada a trabalhar para os Thénardier.
Javert - inspetor de polícia
Um inspetor de polícia obsessivo que sempre persegue e perde Valjean de vista.
Ele se disfarça por trás da barricada, mas é descoberto e desmascarado por Valjean que tem a chance de matá-lo, mas ele o deixa ir. Mais tarde, Javert permite que Valjean escape por poupar sua vida.
Pela primeira vez, Javert está em uma situação na qual ele desrespeita a lei.
Seu conflito interior o levará a medidas extremas.
Thénardier (Jondrette, Senhor Fabantou, Senhor
Thénard)
Um estalajadeiro corrupto e sua esposa. Eles têm cinco filhos: duas filhas
(Éponine e Azelma) e três filhos (Gavroche e dois filhos mais jovens não
identificados). Eles cuidam de Cosette em seus primeiros anos, maltratando e abusando dela.
Eles também escrevem cartas sobre Cosette a Fantine, a fim de extorquir dinheiro dela.Mas acabam por perder a estalagem, devido à falência e se mudam para
Paris, vivendo como os Jondrette. Senhor Thénardier está associado com um bando criminoso chamado. Patron Minette, mas ao contrário do que se pensa, ele não é o chefe, pois operam de forma independente. A família Thénardier também vive ao lado de Marius, que reconhece Thénardier como o homem que "salvou" seu pai em Waterloo. Eles são presos por Javert, após Marius frustrar suas tentativas em roubar e matar Valjean na casa Gorbeau. No final do romance, com a senhora Thénardier morta na prisão, ele e Azelma viajam aos EUA com a ajuda de Marius, onde Thénardier se torna traficante de escravos.
Éponine - Filha mais velha dos Thénardier.
Quando criança, ela é mimada por seus pais, mas acaba como uma
menina de rua, quando chega à adolescência.
Ela participa de crimes de seu pai e elabora esquemas para conseguir dinheiro.
Deixei Marius e outros personagens símbolos da resistência contra o governo para não alongar o conteúdo.
Partindo das ações e juízo de valor dos personagens centrais, é possível identificar dois princípios de ética: A ética cristã pautada no humanismo, compaixão e empatia. A ética materialista que demonstra uma sociedade egoísta e cruel, com os menos afortunados e a exclusão social. As duas irão se confrontar o tempo todo.
As pessoas são divididas em duas categorias como define Victor Hugo:
“As das classes dos que têm e dos que não têm” e não há lutas entre elas.
No caso, o “empreendedor” assume o papel do governo, ao prover as
necessidades básicas do trabalhador, através de condições de trabalho.
Ele tentava comprovar que as obras de caridade feita por indivíduos privados e
não pelo governo – ajudam os pobres.
Na obra, ele demonstra que através de empreendedores habilidosos,
como Jean, é possível acontecer, o que hoje chamamos de “terceiro setor”.
Ou seja, ele não foi amarrado no tronco como na época atual, mas acobertado pelo
Bispo que, omitiu seu roubo, e transferindo para ele a obrigatoriedade de ser honesto, a partir daí.
Lembrando
que o escritor não era adepto ao socialismo e nem ao comunismo, mas de um
espírito libertário, achava que o maior bem é a liberdade, como “O maior bem mais precioso de toda a humanidade. Comida e água não são nada; vestimentas e abrigos são luxos. Quem é livre permanece com sua cabeça erguida, mesmo que esteja com fome, sem
roupas e sem teto. Eu dedicarei a minha própria vida, o que quer que ainda reste
dela, à causa da liberdade – liberdade para todos!”
Nota: “Tudo bem, Victor,
mas que adianta ser livre, se tanta gente vive sem ter com o que viver”,
parafraseando Engenheiros do Hawaii. O próprio Bonaparte dizia que “De nada
adianta o talento sem oportunidades”, ele recebeu bolsa de estudo para sua
formação.
Hugo também era contra a redistribuição de riquezas, com elas iria minguar o estímulo da produção. Era contrário ao ideal do comunismo e da reforma agrária que visam distribuição de renda, pois, defendia que a distribuição destrói a produtividade.
A repartição em partes iguais mata a ambição e, por consequência, o trabalho. Portanto, é impossível tomar essas pretensas soluções como princípio.
“Destruir riqueza não é distribuí-la”, segundo Victor Hugo. Diga-se de passagem, era uma personalidade complexa e controversa como descrita na sua biografia:
Quando jovem, apoiara a monarquia francesa; mais tarde, admirou Napoleão Bonaparte por supostamente defender os princípios da liberdade e igualdade.
Quando tinha quarenta e nove anos, desafiou publicamente Napoleão III,
o tirânico imperador. Em decorrência disto, perdeu suas luxuosas casas, suas enormes coleções de antiguidades e sua esplêndida biblioteca de dez mil livros;
mas, ressurgiu como exilado eloquente, que defendia a liberdade para todos os povos.
No fim da sua vida, quando mais tinha o que perder, dedicou–se à causa da liberdade.
Em 1822, aos vinte anos, defendeu o Visconde François René de Chateaubriand, um escritor francês famoso que, entrara em conflito com o governo. Certa vez, ofereceu sua casa como refúgio para um amigo de infância que fugia da polícia.
Durante a Revolução de 1848, na França, Hugo saiu em meio aos tiroteios para pedir por um fim à violência.
Assim como Jean Valjean em “Os miseráveis”, Victor Hugo ajudou os pobres com dinheiro do próprio bolso.
Começou em casa, ajudando sua esposa, que tinha se afastado dele, e seus filhos sem muito dinheiro para si próprios. Ordenava a seu cozinheiro que alimentasse os mendigos que aparecessem a sua porta.
Cada quinze dias, aos domingos, servia o “jantar das crianças pobres” para cerca de cinquenta jovens famintos do seu bairro.
Em seus diários abundam os exemplos de caridade pessoal.
Conforme o biógrafo, André Maurois, durante seus anos mais prósperos, Victor Hugo chegava a gastar todo mês um terço de sua renda em obras de caridade.
Nota-se que o escritor estimula uma sociedade livre, comprometida e transfere a responsabilidade para os empreendedores, a elite, a complacência para os contraventores e que, a igreja interfira na ética, sobrepondo a moral com a ética cristã e humanista.
Ele não pede para quem está com pena “adotar um bandido” ou sair pelas ruas em defesa da ordem e segurança, se acaso esta falhar, mas para ser empático.
Que o papel de todos sermos engajados, dar amparo aos menos favorecidos, suprir suas necessidades, os incluindo através das oportunidades.
“Se o Estado é ineficaz, não supre e nem resolve os problemas ou carências sociais, que façam os do setor privado e civis”.
Reconheço que ele cumpriu com seu papel de cidadania, estava com certeza em 1% de cada 1000, segundo estatística de psicologia social, que age de forma altruísta e comprometido com o bem.
Coloca a ética cristã acima da ética moral e social, da crítica, do repúdio, exclusão e punição.
Observações finais:Sobre Terceiro setor, esta definição surgiu
na primeira metade do século passado, nos Estados Unidos.
Segundo Cristina Moura e Talita Rosolen, doutorandas em Administração na FEAUSP, explicaram que a sociedade é formada por três setores: o primeiro
caracteriza-se por utilizar meios públicos para fins públicos, representado
principalmente pelo Estado; o segundo setor é o que utiliza fins privados para
meios privados (empresas); por fim, o terceiro é uma combinação: utiliza-se de
fins privados para atingir meios públicos. Formam esse grupo as organizações
não governamentais, fundações, associações comunitárias e entidades
filantrópicas, por exemplo. A grande preocupação do terceiro setor é
causar impacto positivo na sociedade, se propondo a resolver parcial ou
totalmente um problema.
No Brasil, esse setor nasce com o fim da ditadura militar e
ascensão da crise econômica. Com o Estado falido, instituições não
governamentais tomam a iniciativa de resolver problemas urgentes. Ao mesmo
tempo, com a expansão desenfreada do capitalismo global revelando diversas
mazelas sociais e ambientais, a sociedade passa a exigir das empresas mais
responsabilidade social, ultrapassando a visão anglo-saxônica de que uma
empresa deve gerar apenas lucro.
As ações sociais das empresas e do terceiro setor são chamadas
de investimento social e possuem foco em resultados, além de manter uma
sinergia com os negócios e visar a inserção dos indivíduos na comunidade. Se
diferencia, portanto, da caridade, que são ações isoladas e pontuais, sem muito
planejamento e análise. Entre os dois conceitos, há também a filantropia, que
vem de fundações e organizações independentes e é mais organizado do que a
caridade, mas não tão bem estruturado como um investimento social.
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Para ler ou comprar o livro, "Os Miseráveis":
De qualquer forma, Victor Hugo, transcendeu as barreiras da ficção para criar uma obra que reúne um drama romântico, uma epopeia, um documento histórico, um ensaio filosófico, um tratado sobre ética e um estudo sobre literatura e linguagem.
Nada disso seria possível sem o fascínio exercido pelas reviravoltas de seu enredo e pelo carisma de seus personagens.
Como o “criminoso” Jean Valjean sua jornada desesperada em busca de redenção.
Ou a explorada e prostituída Fantine e sua filha Cosette, ou do pequeno Gavroche, filho de um lar desajustado que foge de casa para viver nas ruas.
Unidos pelo idealismo e pelo gênio narrativo de Victor Hugo, esses excluídos e heróis improváveis fazem de “Os miseráveis”, um grito de liberdade que continua a ecoar até os dias atuais.
Prefácio de Alexandre Boide (Tradutor) e, que fingimos não ver.
Considerações finais:
*A Analogia do livro se deu devido a uma jornalista adepta de amarrar no tronco um rapaz acusado de roubo, em plena democracia e Direitos Humanos em voga, porém, declarou anos antes, que este era o seu livro favorito.
*O pensamento de Victor Hugo não reflete necessariamente o meu, pois, sou a favor da distribuição de riquezas e do cooperativismo, filosofia humanista, altruísmo, respeito às diversidades e adepta do voluntariada e ajuda humanitária. A vida é curta demais para agirmos como déspotas e mesquinhos para com os outros.
*Resumo dos personagens e a vida de Victor Hugo extraído do Site “Literatura Universitária”. *O conceito de setores da sociedade extraído do site www.fea.usp.br